Trajetória
“O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.”
Guimarães Rosa
Nasci na Alemanha, porque na época meus pais, brasileiros, moravam lá. Com dois anos de idade, contudo, já estava no Brasil com eles e meu único irmão, que nasceu logo depois de mim. Fui criada em Porto Alegre junto à família paterna – gaúcha, com descendência alemã. Lá morei por quase doze anos, estudando em colégio bilíngue (alemão/português).
Durante o Ensino Fundamental, em razão de desejos profissionais do meu pai, nos mudamos para Fortaleza. Morei durante dez anos no Ceará, onde concluí os estudos escolares e dei início aos estudos acadêmicos, na Faculdade de Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC). A escolha pela Psicologia se deu de forma despretensiosa e ingênua, a partir de uma vontade comum aos estudantes no primeiro semestre do curso: ajudar as pessoas.
Minha paixão pela Psicologia chegou depois, ao longo do curso, à medida em que me encantei pela psique. Ao longo desses anos, também realizei dois intercâmbios na Alemanha, um escolar e um acadêmico – fui para aprender sobre a língua e a cultura do País em que nasci e acabei aprendendo também sobre liberdade, coragem, autonomia, amizade, diversidade, família…
Durante esses anos, também houve um ciclo em Belo Horizonte, onde fiz uma mobilidade acadêmica: estudei Psicologia na UFC, mas uma parte do curso fiz, por decisão minha, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). No mesmo período, em Belo Horizonte, trabalhei como estagiária de graduação no Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) pela defesa e pela promoção de Direitos Humanos. Lá eu era parte de uma equipe interdisciplinar que se dedicava a demandas relacionadas à classe, raça, gênero, privação de liberdade, controle externo da atividade policial e resolução extrajudicial de conflitos comunitários.
Essa experiência foi um divisor de águas em minha vida. Mudou a forma como via o mundo e, principalmente, a mim mesma.
Mais tarde, logo após me formar como Psicóloga, retornei para Belo Horizonte, para a UFMG e para o MPMG: enquanto realizava a pesquisa de Mestrado em Psicologia, trabalhei como estagiária de pós-graduação no MPMG, mais uma vez pela defesa e pela promoção de Direitos Fundamentais.
Só depois de me tornar Mestra em Psicologia, em 2018, dei início à carreira de profissional autônoma, na área de Psicologia Clínica, como psicoterapeuta. No início, atendia em dois lugares: Belo Horizonte, onde eu morava, e São Gonçalo do Sapucaí, uma cidade localizada no Sul de Minas Gerais, onde mora minha mãe e boa parte da família dela. Depois, em 2020, motivada pela pandemia, passei a trabalhar com a modalidade remota de psicoterapia e, graças a essa decisão, pude me mudar para Florianópolis, onde moro atualmente.
Sempre me incomodou aquela história de que levaria algum tempo para “fazer nome e clientela” em algum lugar, onde deveria manter meu consultório até me aposentar. Hoje, como Psicóloga que trabalha por meio da psicoterapia remota, divulgo meu trabalho com a internet, por meio do marketing de conteúdo e do branding pessoal, alcançando pessoas de lugares diferentes (inclusive de outros países). Assim, posso morar em qualquer parte do mundo em que exista uma boa conexão de internet, silêncio e privacidade.
Não estava nos meus planos, tampouco era um sonho ser uma pessoa nômade. Simplesmente me tornei uma por dispor da liberdade de ir e vir que amo e priorizo em minhas decisões e escolhas.
Então, como é possível perceber, já morei em muitos lugares e viajei bastante. Me percebo extremamente privilegiada por todos esses movimentos e sou grata por cada um deles em razão das pessoas completamente diferentes com quem me relacionei (de modo superficial ou profundo), das histórias que conheci e dos muitos modos de ser e viver que testemunhei ao longo do caminho que construí até aqui.
Entrei em contato com essas pessoas, essas histórias e esses modos de ser e viver com admiração, com estranhamento, com emoção e, sobretudo, com grande curiosidade e profundo respeito. O ganho não foi apenas pessoal. Foi profissional também, porque, para ser psicoterapeuta, não basta conhecer teorias e técnicas; é preciso ter um repertório diverso – o que amplio a cada viagem, mas também a cada leitura, a cada diálogo, a cada filme, a cada curso, a cada música etc. Afinal, como poderia acompanhar bem as pessoas que confiam em meu trabalho se não tivesse abandonado a ideia romantizada de humanidade para conhecer toda sua complexidade e ambivalência? Parafraseando o filósofo, sou humana, e nada que é humano me é estranho.
Além disso, “Do ponto de vista dialógico de Buber, todo ‘eu’ é posterior à relação, pois é no diálogo com o ‘tu’, diferente e separado do ‘eu’, que se constrói a noção de ‘si mesmo’ e do ‘outro’”, como escreveu Carlene Tenório. Em outras palavras, é preciso entrar em contato com o outro – outra pessoa, outro grupo, outro lugar, outra cultura etc. – para se diferenciar dele e, diferenciando-se dele, conhecer a si mesma ou a si mesmo.
Então, foi também nesse meu caminho de tantos movimentos que conheci minha família, a cultura a partir da qual fui criada, os grupos dos quais fiz parte, as instituições que frequentei e, finalmente, a mim mesma.
Sou, portanto, o País onde nasci e este em que cresci, os lugares por onde passei, a família que me educou, as pessoas com quem me encontrei e aquelas com quem convivo, os grupos dos quais fui e sou parte, a graduação e o Mestrado em Psicologia, os processos dos quais participo como psicoterapeuta, a escolha cotidiana pela Gestalt-terapia, as cidades onde morei, a Ilha que escolhi para amar e chamar de lar… Sou também meus desejos, meus medos, meus valores, minhas limitações, meus desafios, minhas dúvidas, meus hábitos… Ainda sou filha, irmã, neta, prima, sobrinha, amiga, namorada, cunhada e nora.
Vivo para amar minhas amigas, meus amigos e minha família – a que me trouxe ao mundo e a que estou construindo; para contemplar a natureza; para praticar esportes, principalmente natação; para ir à praia; para assistir filmes de drama (de preferência baseados em fatos reais); para apreciar vinhos e cervejas artesanais a pretexto de qualquer bom encontro; para ter diálogos profundos; para viajar até lugares em que possa conhecer mais diversidade; para ser cada vez mais autêntica e espontânea; para escutar músicas instrumentais ou acústicas; para me deixar afetar pela arte, especialmente pela literatura e pela poesia; para aprender hábitos saudáveis para mim e também para as outras espécies e o meio ambiente; para me deliciar com os sorvetes artesanais; para tomar café preto e puro ou chá de capim-limão com gengibre; para compartilhar reflexões; para libertar emoções; para promover liberdade; para desenvolver autonomia, responsabilidade e empatia; e por aí vai; vou!
Para saber ou sentir um pouco mais sobre mim, me acompanhe:
Meu amor pela Literatura existe desde minha infância e me parece que a cada boa leitura se torna ainda mais bonito, forte e importante. Está entre as proezas que mais admiro essa de nomear o que a maioria de nós é capaz de sentir, mas não de elaborar, compreender ou expressar, especialmente por meio da linguagem verbal. Simplesmente me encanta o encontro das experiências com as palavras. Por isso, compartilho com vocês algumas das obras que mais me impactaram, influenciando minha visão de mundo e de mim mesma.
- A morte de Ivan Ilitch, de Leon Tolstói
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A morte é um dia que vale à pena viver, de Ana Cláudia Quintana Arantes
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Admirável mundo novo, de Aldous Huxley
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Americanah, de Chimamanda Ngozi Adichie